sábado, 4 de outubro de 2008

OS NKICES


OS NkiceS

Dentro do candomblé os Nkices são para os Bantus o mesmo que os orixás e o mesmo que os orixás são para os Yorubás, ou ainda, o mesmo que vodum para os Daometanos. Muitos autores cometem o mesmo erro ao tratar das semelhanças existentes entre um Nkice, orixá ou vodum, pois confundem, semelhanças como correspondência, fazendo-no acreditar que na verdade se tratam da mesma divindade apenas com nome distinto. Esta visão é equivocada, e cabe a nós desfazermos tal equivoco. Cada Nkice, orixá ou vodum possui peculiaridades próprias, tratamento e culto diferenciados. Pode-se sim,dizer que existem pequenas coincidências, como por exemplo o fato de Kabila, Oxósse e Otulu serem caçadores, ou ainda, por usarem as mesmas cores. Mas não há que se confundir um e outro, pois mesmo em suas origens na África se diferem, sendo o primeiro (Kabila) originário do Congo, o segundo (Oxossi) originário das terras Yorubás e o ultimo (Otulu) do Reino de Dahomé.

Desta forma, elenco abaixo alguns dos Nkices de Angola e Congo, sem fazer qualquer correspondência entre orixá ou vodum, dando ao lado de seus nomes uma breve descrição:

Aluvaiá, Bombojira, Vangira (feminino), Pambu Njila.

É o Nkice responsável pela comunicação entre as divindades e os homens. Esta nas ruas, é a este Nkice que pertencem as “bu dibidika jinjila” (encruzilhadas). Suas cores são preto, vermelho e azul arroxeado.

Nkosi Mukumbe, Roxi Mukumbe.

É o Nkice da guerra, das estradas. É a ele que se fazem oferendas com o fim de obter abertura de caminhos. Sua cor é o azul escuro.

Kabila, Mutalambô, Gongobila, Lambaranguange.

Nkice caçador, habita as florestas ou montanhas. É o responsável pela fartura, pela abundância de alimentos. Suas cores: Gongobila azul celeste para Mutalambô e Kabila, verde e para Lambaranguange azul e branco.

Katendê.

Nkice dono dos segredos das “insabas” (folhas, ervas).Sua cor é o verde ou verde e branco.

Zaze, Loango.

Nkice responsável pela distribuição da Justiça entre os homens.

Suas cores são: vermelho e branco.

Kaviungo ou Kavungo, Kafungê.

E o Nkice responsável pela saúde, estando intimamente ligado a morte usa preto, vermelho, branco e marrom.

Angorô e Angoroméa.

Assim como Bombojira, auxiliam na comunicação entre as divindades e os homens. São representados por uma cobra, sendo o primeiro (Angorô) masculino e o segundo (Angoroméa) feminino.

Kitembo ou Tempo.

É o responsável pelo tempo de forma geral, especificamente, pelas mudanças climáticas (como chuva, sol, vento etc), portanto, atribuído a ele, o domínio sobre as estações do ano. É representado, nas casas Angola e Congo, por um mastro com uma bandeira branca. Usa cores fortes, como: vermelho, azul, verde, marrom e branco.

Tere-Kompenso.

É um jovem caçador que obtém, seu sustento ora através da caça, ora através da pesca. Suas características são as mesmas das dos caçadores (Kabila, Mutalambô, Gongobila, Lambaranguange) unidas as características dos Nkices da água doce (Kisimbe, Samba). Suas cores: azul claro e amarelo ouro.

Matamba, Bamburussenda, Nunvurucemavula.

Trata-se de um Nkice feminino. É guerreira e está intimamente ligada a morte, por conseguir dominar os mortos (“Vumbe”). Suas cores são o vermelho e o marrom avermelhado, rosa e branco.

Kisimbi, Samba.

Nkice feminino, representa a fertilidade, é a grande mãe. Seu domínio é sobre as águas doces. Sua cor é o amarelo ouro e o rosa.

Kaitumbá, Mikaiá.

Também um Nkice feminino, tem domínio sobre as águas salgadas (“Kalunga Grande” , o mar). Sua cor: branco cristal.

Zumbarandá.

É um Nkice feminino, representa o início, vez que, é a mais velha das mães. Também tem relação estrita com a morte. Sua cor: azul.

Wunge

É o mais novo dos Nkices. Representa a mocidade, a alegria da juventude. Durante o toque para este Nkice, a dança se transforma numa grande brincadeira.

Lembá Dilê, Lembarenganga, Jakatamba, Kassuté Lembá, Gangaiobanda.

Nkice da criação, ora apresenta-se como jovem guerreiro, ora como velho curvado. Está ligado a criação do mundo. Quando jovem tem como cores o branco e o azul, quando de idade avançado, apenas o branco.

Zambi, Zambiapongo.

Não se trata de um Nkice, mas sim do Deus Supremo, o grande criador.

PSIQUIATRIA E CANDOMBLÉ


PSIQUIATRIA E CANDOMBLÉ

Trechos da entrevista concedida por Mãe Stella à Dra. Solange Rubim de Pinho sobre o tema psiquiatria e candomblé, em 04 de maio de 2001.

O candomblé incorpora, funde e resume as várias religiões do negro africano. Há sempre um pequeno altar com imagens e registros, mas os seres que vem ao terreiro são deuses africanos, como Ogum, Oxossi, Xangô, Omulu, Oxum e outros. Nele, os antepassados se divinizam através dos orixás e realizam a comunhão espiritual entre os vivos seus ancestrais. Não se trata de uma comunhão simbólica como no Catolicismo, nem acidental como a dos mortos no Espiritismo. Aqui, os dois mundos se confundem. Os deuses e os mortos se misturam, ouvem suas queixas, aconselham, dão remédio para dores e consolos, o mundo celeste não esta distante nem superior, ele pode conversar com cada um que esta entre nós.

As divindades naturais da África não têm representação antropomórfica.

Elas são representadas pelas forças da natureza: fogo, pedra, arvore ar, água doce (rio) e salgada (mar)...

São, portanto, características da religião: o culto aos antepassados, a crença na sobrevivência da alma, a diminuição da ansiedade frente a morte, a força do sobrenatural. Eis a razão do extraordinário vigor do candomblé.

Originalmente, a palavra Candomblé foi usada com referencia aos cultos jeje-nagôs na Bahia. Mais tarde foi estendida para os outros cultos de origem africana, a exemplo dos do Candomblé Angola e de Caboclo.

Identificação dos Transtornos Psiquiátricos

Stella: Veja bem, creio que cada um de nós tem uma neurose, não é? Pequena neurose. Mas quando a coisa ultrapassa e a medicina não tem condições de resolver esse problema, é sinal que existe algum fato espiritual. Daí, não que nos sejamos curandeiros, mas o nosso trabalho é equilibrar a mente, é equilibrar o psíquico da pessoa, espiritualmente, e quem este equilibrado é evidente que não tem estes distúrbios. O nosso cuidado é esse. Agora, nós cuidamos como? Nós equilibramos com rituais, é justo porque tudo nosso é ritual, com banhos, com ebós que são oferendas que fazemos. E nós aqui não usamos tratamento de ingerir coisa nenhuma, aqui só se bebe acaçá, que o milho branco, durante o recolhimento do Yaô, tem casa que trata os Yaôs com ervas para acalmar com cidreira, capim santo etc..

Usamos banhos que chamamos de limpeza, alem dos ebós. E, mais ainda, agente tem de acreditar em alguma coisa, saber que existe e acreditar, isso nos segura bastante.

Porque se você se acha solto no mundo, evidente que vai ficar neutorico vai entrar para a loucura, porque se sente desprotegido. E você tendo o seu guia, o seu orixá, o seu protetor espiritual, é diferente. É evidente que é uma coisa que você não vê, mas sente que ele esta com você.

Muitas pessoas procuram uma casa de culto aos orixás pedindo que queiram rapidamente que o marido volte para casa, que o filho passe no vestibular, mas não é nada disso. Vamos-nos cuidando espiritualmente do ori, que seria o nosso cérebro espiritual, e a gente como o ori fortalecido fica imune a determinadas coisas, a que vocês chamam de neurose.

Identificação do tratamento a ser orientado.

Stella – Quando é distúrbio físico, é normal que a medicina cure. Mas, quando é fraqueza espiritual, como nós chamamos, tem de ter a intervenção das coisas de orixá. Daí, já tenho tido exemplo de gente de chegou aqui para ser iniciada até na loucura, andando por ai sem roupa: depois que fez a obrigação, curou-se, e até hoje não teve mais nada. Já fiz também obrigações para outras que tinham distúrbios psíquicos e essas melhoram, mais não ficaram boas. É sinal de que não era uma coisa espiritual, era uma doença física, ela tinha um distúrbio lá que não sei, de loucura mesmo.

Quando a coisa é espiritual, nos aqui, com as nossas praticas que não são remédios, nos conseguimos dar um alivio á pessoa.

COLETANEA DO TATA CONGOFILA.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

CRIME E CASTIGO


Fernando Khouri
(Babalorixá Ala Igbin)

Crime e Castigo

Em um tempo anterior ao Cristianismo e mesmo ao judaísmo, enquanto Jeová era apenas mais um entre os deuses do deserto, a terra era habitada pela harmonia; o ser humano preocupava- se em viver. Conheciam o amor, o ciúme, a inveja, e a admiração, mas desconheciam o pecado.

Na África, o negro cultuava seus deuses, nascidos na divinização dos antepassados, livre da idéia de pecado e da divisão entre o bem e o mal.

Para eles – os negros-, os deuses e os homens eram constituídos de uma mesma idéia, que não era má e também não era boa.

Tudo era ambíguo, o mesmo homem que matava uma ovelha para comer salvava outra de ser picada por uma serpente. O mesmo Deus que mandava chuva, para regar as lavouras, também inundava os rios que desabrigava centenas ou milhares de negros.

O mal só passava a existir a partir do momento em que orí (a cabeça) dissesse que aquilo estava errado, ou seja, o homem era condenado por si mesmo, só ele podia julgar seus próprios atos. Assim era em todas as civilizações pré-judaicas – na Europa; na África, nas Américas, onde até hoje os aborígines pensam desta forma.

O pecado e seus possíveis castigos foram as armas encontradas por Moisés para controlar e guiar o povo judeu.

Como o resultado foi ótimo (para eles), a receita foi repetida pelo cristianismo, e deste se alastrou para muitos outros credos, contaminando até mesmo as culturas anteriores a esta invenção. Toda mentira, repetida mil vezes, torna-se uma verdade, por isto todos os dias nosso orí (cabeça) nos condena por crimes que não cometemos e vivemos torturados pela divisão que nos habita, entre o bem e o mal; entre o certo e o que os outros dizem ser errado. O pecado nos coloca à mercê da condenação por outro.

Não crendo em pecado, estou livre, até que orì me condene e sendo assim, posso viver plenamente e exatamente de acordo como o desejo dos Deuses.

Dentro do candomblé o pecado é a conciência de cada indivíduo.

NZAZE

INKICE - NZAZE
CORRESPONDENTE AO ORIXÁ XANGÔ

Nzaze

"Aquele que se destaca pela força e revela seus segredos"

Nzaze é o Nkisi das pedreiras, Nkisi dos raios e do trovão, Nkisi da justiça é o Nkisi que gera o poder da política. Guerreiro, bravo e conquistador, Nzaze também é conhecido como o Nkisi mais vaidoso entre os Minkisi masculinos. É monarca por natureza e chamado por rei.

Nzaze é a ideologia, a decisão, a vontade, a iniciativa. É a rigidez, organização, o trabalho, a discussão pela melhora, o progresso social e cultural, a voz do povo, o levante, à vontade de vencer. Também o sentido de realeza, a atitude imperial, monárquica. É o espírito nobre das pessoas, o chamado "sangue azul", o poder de liderança.

Para Nzaze, a justiça está acima de tudo e, sem ela, nenhuma conquista vale a pena; o respeito pelo rei é mais importante que o medo.

Este, que apesar de grande guerreiro, justo e conquistador, detesta doenças, a morte e aquilo que já morreu. Nzaze é avesso a Mvumbi (espíritos desencarnados). Admite-se até que ele é uma espécie de imã de Mvumbi, daí sua aversão a eles.

Este nkice representa a sedução masculina, já que teve três Yabas, Dandalunda, (oxum), Obá e Matamba (yansã), e protetor dos intelecutais, estudiosos, advogados e juízes e tudo que esta relacionado a justiça.

A Ku Menekene Usoba Nzaji – Nzaze

(Salve o Rei dos Raios – Grande Raio)!

COLETÂNEA TATA GONGOFILA

Psicanálise e religião


Psicanálise e religião

Cristãos e não-cristãos, todos nós fomos, de alguma maneira, influenciados pelos ensinamentos de Cristo. Todavia, não é minha intenção o seu sentido místico e religioso. Não estou sequer qualificado para tanto. Não sou teólogo ou psicanalista. Discutirei, portanto, os aspectos psicológicos da doutrina de Cristo. Discutirei, à luz da psicanálise, o sentido de pecado e de salvação.

Utilizando uma terminologia psicanalítica, eu entenderia a virtude como aquele jeito de viver que nos torna mais sadios, mais capazes de crescer emocionalmente e, portanto, de nos tornarmos mais felizes, mais realizados. E entenderia pecado como aquelas atitudes de cabeça que fazem as pessoas se sentirem perdidas, angustiadas e infelizes. Por pecado eu entenderia aquele jeito de pensar, de sentir e de agir que leva ou ao empobrecido da personalidade (cabeças empobrecidas e corações mediocrizados) ou “a doença mental (neurose, psicose, etc.)

Sendo que esse “pecado de cabeça” nos foi ensinado pela sociedade e até por nossos antepassados levando assim a acreditar que a ignorância humana não é uma atitude interior e sim o que nos foi passado.

O que significa a palavra “religião”? Religião significa religar, ligar de novo. Ou seja, redescobrir o nexo das coisas, não deixar nosso pensamento se perder e se consumir numa eterna difusão. Como a vida é sempre maior do que nossa capacidade de compreendê-la, algo que nos ajude a estabelecer a ligação entre as coisa é sempre bom. A perdição não é ter pensamentos sexuais. É, isso sim, estará deriva, como nau sem rumo equivocado. A cabeça imagina que encontrou seus objetivos, mas, na realidade, esta desnorteada, não sabe o que quer, pra onde vai, nem por que faz as coisas que faz. E doença mental é isso: é estar à deriva, levado por impulsos e obsessões, ou perdido dos outros e de si mesmo. Um labirinto de desejos e emoções dentro do qual, na realidade, não nos encontramos.

E o que significa a palavra pecado? Pecado vem do latim, “pecare”, que significa “errar o alvo”, estar desorientado, sem bússola ou com a bússola errando nas informações que oferece.

Por isso, a verdadeira psicanálise não pode conflitar com as verdadeiras religiões. Quando saímos da superfície das aparências imediatas, descobrimos muitos pontos em comum.

A psicanálise, por exemplo, não considera as crianças anjinhos ou querubins. Desde o berço, a cabecinha do bebê está a mil. Desde o nascimento da criança é extremamente generosa, mas extremamente cruel. É sujeita a grandes amores e grandes ódio. A um só tempo, é dócil e temperamental, crédula e desconfiada, ingênua e maliciosa. E sua malícia não se resume a aprontações inocentes: não: estas são abertamente sexuais. Só que a maneira de a criança transar sexo é diferente daquela que terá quando for adulta. Nos seus momentos de cólera, se tivesse meios, seria concretamente capaz de realizar atos de extrema violência. Em síntese, já existe na criança, em miniatura, em estado de semente, todas as virtudes e todas as misérias do adulto.

Eduardo Mascarenhas.

No candomblé somos considerados cristãos de acordo com o documento oficial - Africae terrarum de 1967 do Papa Paulo VI, que valoriza a religião africana.