terça-feira, 2 de março de 2010

A Criação dos Seres.


 

 Diziam os Kassanjes que outrora todos nós habitávamos o mundo espiritual. Mutalambo são as lendas contadas pelos kassanjes, que falam sobre a precipitação da grande energia sobre o mundo material. Conta a lenda que, no passado, Angomi (o universo) era o próprio Zambi (Deus supremo de Angola). Nesse tempo Angomi dormia sono profundo e se expandia cada vez mais.
Ao crescer, Angomi foi vendo que ao seu redor, estava inserido o desconhecido. Como não podia sair do seu espaço, transformou-se numa gigantesca bola de fogo e começou a emitir forte luz e a concentrá-la em um determinado ponto, criando assim um ser alado a quem chamou de Aluvaiá (Anjo de Luz).
Após ter dado a Aluvaiá a essência da vida (o sangue), e o poder da criação da matéria (o pó de pemba), pediu-lhe para percorrer o espaço desconhecido e trazer informações. Aluvaiá então alçou vôo em direção ao espaço. Ao penetrar no desconhecido, Aluvaiá começou a ficar ambicioso. Sentindo-se poderoso pelo segredo obtido, resolveu não mais voltar. Passou então a moldar as massas, após precipitar energia, transformando-as em matérias.
Criou ao seu bel prazer tudo aquilo que lhe vinha na mente, ou seja um mundo para ele próprio governar. Criou o sol, a lua, a terra, outros planetas, as estrelas, os animais, os vegetais, os minerais e etc. Os seres criados por ele passaram a ocupar os grandes centros de massas aglutinadas chamados mundos. Eles não tinham porém, o segredo da perpetuação, única chave que ficou guardada com Zambi. Aluvaiá não se incomodava com isso e criava, a cada dia e a cada momento, um novo ser. Entretanto estes seres duravam pouco, por isso foram a presença de Aluvaiá , pedir vida longa. Apanhado de surpresa este bolou rapidamente um plano astucioso, usando o que lhe veio de imediato à mente maligna. Falou! __Ide em busca de um fruto que tenha alguma semelhança com a vossa raça e traga-o a minha presença para que eu o transforme em taça, dizendo isto, Aluvaiá acomodou-se tranquilamente em seu trono, se vangloriando de ter enganado as criaturas, já que eles morreriam procurando algo inexistente.
Passou-se algum tempo, alguns seres realmente morreram, mas dentre os sobreviventes, uma mulher com formas obesas, ao caminhar, já sem esperanças, por um terreno árido e de vegetação rasteira já as margens do infinito, deparou com um fruto volumoso que tinha o formato de um ser humano onde se visualizava muito bem a cabeça o pescoço e o corpo volumoso. Poderia se dizer que era a sua própria semelhança. Satisfeita com o achado, correu a presença de Aluvaiá e lhe apresentou o fruto. Este, pasmo diante do que achava impossível, já que criara tanta coisa sem nem parar pra ver, pegou o fruto que era uma CABAÇA, abriu o fundo, virou ao contrário e transformou-a em taça. Nela depositou o seu próprio sangue deu de beber as criaturas para que suas vidas fossem prolongadas. Todavia, com o tempo Aluvaiá foi enfraquecendo, para se manter poderoso, resolveu então passar a beber o sangue dos seres que ele mesmo criara. Com isso passou a ter a mesma constituição dos seres viventes...
Nesta época os seres não conheciam o verdadeiro Senhor do Universo, Zambi, - aquele que fora criado. Indagando a Aluvaiá, um deles lê pediu a vida eterna. Imediatamente Aluvaiá valendo-se de sua astúcia e libertinagem falou ! __ O segredo está com Zambi. Iria até ele pedir o segredo da perpetuação.
Assim fez , transpôs a barreira o desconhecido e chegou a presença de Zambi. Mentindo, falou que do outro lado haviam seres bonitos, planetas, flores, etc. Mas que se ficasse muito tempo lá se enfraqueceria. Por isso precisava conhecer o segredo da perpetuação. Zambi percebendo as suas intenções falou: "Aluvaiá você me enganou, usando seus poderes e bebendo de sua própria essência. Por isso mandarei você de volta e, como castigo, terá que se manter com a própria essência da vida que você conhece - o sangue".
Zambi tomou a decisão de criar novos seres espirituais para controlar o infinito: eram os Nkices. De tempos em tempos, Zambi pedia a um dos deles para descer ao espaço de Aluvaiá e trazer notícias . Os Nkices viram e informaram que Aluvaiá fazia um bom trabalho. Zambi então pediu que Aluvaiá viesse a sua presença e falasse de suas obras.
Aluvaiá pediu ajuda àqueles que eram os mensageiros de Zambi. Para isso, usando da resposta positiva desceu com eles aos mundos habitados. Os Nkices, vendo a grande obra, passaram a ter os domínios dos mares, matas, ares, fogo, etc. Aluvaiá vendo seu império comprometido, zangou-se com os Nkices. Estes alegaram que tais segredos de formação da natureza valorizaram o seu trabalho.
Os Nkices de posse do domínio de Aluvaiá, passaram a capacitar os seres de realizar diversas proezas. Aluvaiá com isso foi perdendo o seu poder e resolveu voltar a Zambi, alegando que os mensageiros expulsaram-no do seu espaço. Zambi deu então a Aluvaiá missão intermediária de ficar entre os dois espaços.
Com o passar dos tempos, os seres, sentindo necessidade de Aluvaiá, faziam-lhe sacrifícios para chamá-lo, já que estes ficaram dependentes do sangue por ele criado. Como castigo, Aluvaiá ficou com a responsabilidade de manter a vida material, através do sangue.
Esta é uma lenda Kassanje de origem Banto que além de trazer para o Brasil os Candomblés de Angola e Congo, trouxe também a Arte Negra e os elementos folclóricos como o Maracatu, a Capoeira, o Jongo, o Samba primitivo, o Maculelê e muitos outros segmentos culturais ainda pouco divulgados. 
         
        COLETÂNEA TATA GONGOFILA (Tata de Nkice Ananguê de N’gola Djanga ria Matamba.)

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